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Tudo está bem quando acaba bem

por Jorge Ribeiro Mendonça, em 31.10.13

O processo-crime aberto contra o procurador-geral da República foi arquivado. Depois de correr tanta tinta, de dias de conversa sobre o tema e de uma crise diplomática, afinal tudo não passou de um equívoco.

 

Um mês depois vem o Ministério Público dizer que o processo está arquivado há três meses, desde 18 de julho de 2013. Ou seja, está arquivado desde muito antes do pedido de desculpas do Ministro dos Negócios Estrangeiros. É certo que há outros processos, mas este é um dos mais importantes.

 

É só a mim ou esta história cheira muito mal? Um mês depois descobre-se que a decisão já estava tomada, apesar de todos os movimentos dos intervenientes apontarem para o desconhecimento de tal decisão. A Procuradora-Geral da República nada refere nas suas declarações em setembro após serem conhecidas as declarações de Rui Machete. Não se conhecem os fundamentos mas é conhecido o arquivamento.

 

Não deixa de ser interessante a declaração do advogado do Procurador Geral da República de Angola, Paulo Blanco, "A justiça portuguesa não consegue guardar segredo de justiça da investigação, mas guarda segredo do arquivamento, quando, por culpa sua, o nome do investigado foi enlameado na praça pública".

 

Razão tem Ulrich quando ontem disse que Portugal não tem legitimidade para dar lições de moral a ninguém.

 

Tudo está bem quando acaba bem, e Portugal e Angola já poderão voltar alegremente às suas relações diplomáticas de sorrisinhos condescendentes e palmadinhas nas costas cada vez mais sem espinha dorsal.

publicado às 10:17

A privatização da REN

por Jorge Ribeiro Mendonça, em 16.10.13
Não me querendo pronunciar especificamente sobre o caso José Eduardo dos Santos, que vejo como uma manobra negocial para que Portugal se subjugue aos interesses angolanos e porque, na verdade, não representa grande retrocesso nas relações entre os dois países. Na verdade, as empresas portuguesas têm estado a apostar em Angola e investidores angolanos têm estado a investir em Portugal, sem ter existido parceria política "estratégica", o que me leva a crer que na verdade nada se altera. Adia-se ou impede-se um aprofundamento da relação, o que era desejável, mas mais uma vez, o que José Eduardo dos Santos quer é ganhar no tabuleiro das negociações e, sobretudo, das concessões do Estado Português.

Preocupa-me mais um raciocínio que me ocorreu juntando dois títulos que circulavam ontem: o fim de uma parceria estratégica entre dois Estados que mantém relações diplomáticas e a privatização total da REN*. Não me importa especificamente o caso Angola, vejo o caso do ponto de vista abstrato, enquanto relação diplomática entre dois estados. Podia ser os Estados Unidos, a Rússia, a China ou a Costa Rica ou qualquer outro País.
 
Não sou avesso às privatizações. Considero até que as privatizações são em geral muito positivas quando traduzam a oportunidade de criação ou integração de um player dentro de um mercado concorrencial. Por outro lado, a saída do Estado de determinados setores de fornecimento de bens e serviços é de aplaudir.

Mas vejamos o caso da REN. Está em causa a Rede Elétrica Nacional ou seja é o operador que garante o transporte da energia. Não estamos a falar do fornecimento da eletricidade ao comum dos cidadãos, mas da própria rede. O fornecimento é-nos garantido pela EDP, Iberdrola ou pela Endesa, por exemplo.

Ora, após a privatização não é possível garantir quem serão os acionistas da empresa amanhã. E isso é bom!
O problema surge quando se aliena um setor que é estratégico e, acima de tudo, que é o garante do fornecimento de energia elétrica (e de gás) em todo o País. Assim, visto em perspetiva, podemos desenhar um cenário eventual. Uma empresa detida a 100% por um determinado Estado estrangeiro, adquire uma participação relevante na REN.  
 
Naturalmente que quando isso acontecer, Portugal estará na mão dessa empresa, ou melhor desse Estado. Se houver uma crise diplomática grave, Portugal fica totalmente subjugado aos interesses dessa outra nação. Até podemos ter trinta players que nos fornecem energia em casa, mas se a REN não permitir a passagem da eletricidade, podemos esbracejar, pedir desculpa ou lamentar os erros do passado, mas não vamos conseguir ver as notícias na televisão, carregar um telemóvel ou aquecer uma refeição ou um biberon no micro-ondas.
Portugal não é um País que se dê a grandes conflitos, mas a história revela-nos que nem só de paz é feito o nosso passado. Antes de privatizar o que falta da REN (9,9% + 1,2%), vale a pena pensar como é que vamos garantir a nossa independência política e económica e isso não passa só pela redução da dívida pública.
 
* A REN é atualmente detida em 9,9% pela Parpública, 1,2% pela Caixa Geral de Depósitos, 25% pela State Grid (detida pelo Estado Chinês) e 15% pela Oman Oil (Índia).

publicado às 03:31

Obviamente, demita-se!

por Jorge Ribeiro Mendonça, em 07.10.13

Para não esquecer, foram estas as palavras de Rui Machete à Rádio Nacional de Angola em setembro passado: “Tanto quanto sei, não há nada substancialmente digno de relevo, e que permita entender que alguma coisa estaria mal, para além do preenchimento dos formulários e de coisas burocráticas e, naturalmente, informar às autoridades de Angola pedindo, diplomaticamente, desculpa, por uma coisa que, realmente, não está na nossa mão evitar e simultaneamente perceber o que é que aconteceu do lado do nosso Ministério Público, e a senhora Procuradora-Geral deu informações genéricas, que nos asseguraram que as coisas não tinham nenhum grau de gravidade”.

Estas declarações são gravíssimas e abalam gravemente o princípio da separação de poderes, um princípio basilar de Estado de Direito democrático e são uma perigosa ingerência no poder judicial.

Aquelas declarações não são um mero deslize ou “declaração infeliz”, como Passos Coelho apelidou, são algo muito grave que num País decente impediriam a continuação desse Ministro no cargo.

Há que ter noção clara das coisas. Um Ministro que diz isto, seja em que contexto for, passa a mensagem de que tudo é suscetível de influência, seja uma decisão governamental, judicial, privada ou qualquer outra.

A sombra que vai pairar a partir e hoje sobre a justiça Portuguesa é (injustamente?) a de que a mesma é totalmente permeável a interesses políticos, sociais ou económicos. Rui Machete já não vai conseguir apagar esta mancha, por isso só há uma solução “Obviamente demita-se”. Só assim se poderá garantir que alguma réstia de dignidade ainda existe. Quanto à mancha, ao menos que sirva para bradar aos ouvidos de toda a gente a confusão que para aí vai.

publicado às 15:14




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