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Isabel Jonet esta outra vez no centro de ataque nas redes sociais, por ter dito uma frase em entrevista à Renascença que aqui reproduzo na íntegra “o pior inimigo dos desempregados são as redes sociais. Muitas vezes as pessoas ficam desempregadas e ficam dias e dias inteiros agarradas ao Facebook, ou agarradas a jogos, agarradas a amigos que não existem e vivem uma vida que é uma total ilusão”.
O ponto fundamental da frase não é serem as redes sociais. Digamos que esse é apenas o meio usado atualmente para o verdadeiro problema que Jonet identifica.
E o verdadeiro problema “viver uma vida de ilusão”. O alerta de Jonet prende-se com o deixar de viver uma vida real, com pessoas reais e problemas reais e ficar apenas preso ao ilusório. Podem ser os facebooks, mas também pode ser a televisão, um jogo de computador, ou uma data de coisas que podendo ter uma utilização produtiva e positiva, podem ser usadas para cultivar a solidão e a construção de ilusões sobre ilusões.
Mas o problema das declarações da Jonet, não é o que ela diz, mas o que ela representa. E muitos cavalgam e fazem crescer esta onda por militância ativa contra a visão perfilhada por Jonet, pois acreditam que deve ser o Estado a pôr na mesa das famílias assistidas pelo Banco Alimentar os alimentos que esta instituição distribui e não o Banco Alimentar. Os outros apenas se deixam levar na onda por graçola.
Este novo ataque sobre Jonet, tal como o anterior, tem como linha orientadora um ataque à visão social de Isabel Jonet, ao trabalho em favor da comunidade, ao dar sem esperar receber, à caridade ou amor como critério de distribuição de bens. Tudo o resto, como as suas declarações ou a sua condição social, são pretextos para desferir ataques.
Neste mês de abril celebram-se 40 anos sobre a revolução de abril, ou simplesmente sobre Abril. Celebra-se o momento em que a utopia se tornou realidade, a concretização da luta e resistência de muitos contra um regime que teimava em cortar as liberdades. Um regime que não vergou com a Primavera Marcelista* mas caiu ante a força de um povo que disse Não!.
Mas a democracia não se faz num minuto. Demora a construir, a estabilizar, a maturar. E é tanto melhor tanto aquilo que exigirmos dela. O voto é uma arma essencial, mas é igualmente fundamental empenharmo-nos ativamente nos partidos e nas organizações da chamada sociedade civil.
Recordar Abril cai na maioria das vezes na nostalgia ao estilo de “recordar é viver” do Espadinha, esquecendo a esperança combativa dos cantos de intervenção. Mas pior do que isso cai por vezes na nostalgia de ter visto morrer o sonho como nas palavras cantadas pelo José Mário Branco “Quando a nossa festa s'estragou / e o mês de Novembro se vingou / eu olhei p'ra ti / e então entendi / foi um sonho lindo que acabou / houve aqui alguém que se enganou”.
Com Abril Portugal escreveu talvez das páginas mais bonitas na História Mundial das Revoluções. Uma revolução praticamente sem sangue, uma revolução militar que em vez de balas nas armas tinha cravos, uma revolução que pôs fim a uma guerra e a uma máquina indomável. Uma revolução inspiradora tanto há 40 anos como agora.
Mas Abril esteve quase para ser aquilo que muitos não queriam dela. Por isso não existe Abril sem Novembro. Também não existe Abril sem 1 de janeiro de 1986, quando entrámos para a CEE, ou sem 22 de novembro de 1998, data em que começou a Expo98 e em que Portugal recuperou o orgulho envergonhado. Mas também não existe Abril sem os 3 resgates a que Portugal foi sujeito ao longo dos 40 anos passados sobre Abril.
Falta cumprir Abril? Falta cumprir a “paz, pão, habitação, saúde e educação” para todos que o Sérgio Godinho cantava e canta. Mas estamos, apesar de todos os contratempos melhor hoje do que há 40 anos. Aqui se resume o essencial do que deveria ser Abril. O problema está no modo de lá chegar.
Abril foi o sonho feito realidade e como diz a canção de Manuel Freire com o poema de Gedeão “sempre que um homem sonha / o mundo pula e avança”. É fundamental não deixar morrer o sonho.
*Sobre o enquadramento histórico, para além do muito que existe escrito e dito, recomendo um debate disponível no site da Antena 1 entre Fernando Rosas e Jaime Nogueira Pinto, onde se trata muito bem a envolvente histórica de Abril. Interessante por ambos conhecerem muito bem os factos, mas acima de tudo por, tendo ambos vivido aquele tempo e com atividade em campos políticos opostos, demonstram um distanciamento e independência de análise louváveis.