Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
A emergência das livrarias online e dos tablets, kindles e outras tecnologias veio mudar profundamente os hábitos de leitura. A internet facilitou muito o acesso à informação e a partilha de ideias. No reverso da medalha desta facilidade de acesso está naturalmente a sobrevivência das livrarias, grandes ou tradicionais e a discussão em torno da sobrevivência dos livros enquanto objeto.
Dê por onde der, os livros não vão desaparecer. Ocupam espaço, gastam papel, enchem-se de pó, ficam amarrotados, mas é a vida. A sustentabilidade do planeta não fica em causa por existirem livros e nada substitui a experiência de folhear um livro, de amarrotar as capas, de por vezes irritarmo-nos por saltarem as folhas. Nada substitui a possibilidade de sublinharmos com marcadores, esferográficas ou lápis os trechos que por uma razão ou por outra nos tocaram. Nada substitui o cheiro dos livros, aquele cheiro a papel por vezes fresco acabado de imprimir, por vezes velho, amarelento com aquele cheiro a livro-velho quase em decomposição que só os livros velhos, amarelentos e usados conseguem dar.
Há uns dias em conversa com um amigo, falávamos do vício de comprar livros. Lamentei-me contudo que a dificuldade, muitas vezes era conseguir lê-los, por falta de tempo quando existe vontade ou por falta de vontade quando existe tempo. Ele respondeu de forma simples: muitos dos livros não são para ler; compramos porque sabemos que um dia aquele livro vai ser útil ou importante por qualquer motivo.
Há livros que são para ler e para se arrumar, outros para ler e manter ao alcance da mão e do olhar para qualquer eventualidade, outros para ir lendo sempre que por algum motivo algo nos suscite o interesse.
A morte das livrarias não é um problema que afete só Portugal. Num interessante artigo da New Yorker fica claro que este problema também está a atacar as livrarias de Manhattan. E o artigo reza a certo ponto da seguinte forma:
Those of us who cherish our local bookstores do so not simply because they are convenient—how great to be able to run out for milk and also pick up the new Karl Ove Knausgaard!—but also because we feel a duty to support them, because we believe in their mission. When books can be bought so cheaply online, or at one of the dwindling number of discount retailers, paying more to shop at a local bookstore feels virtuous, like buying locally sourced organic vegetables, or checking to see if a T-shirt is made in the U.S.A.
Ler e comprar livros e frequentar as “mercearias de livros” é cada vez mais um ato exótico e de culto, cultivemos portanto este gosto visitando as livrarias das nossas cidades. Ficam aqui algumas sugestões interessantes para Lisboa:
Ler devagar – No Lx Factory www.lerdevagar.com
Alêtheia: na Rua do Século www.aletheia.pt/
Palavra de viajante: Na rua de São Bento, n.º 30 (ao pé do Mini-Preço) http://palavra-de-viajante.pt/
Ferin: na Rua Nova do Almada http://ferin.pt/
Ainda a propósito do post de ontem: Enquanto os países do Ocidente decidem o que fazer com a Rússia os investidores já começaram a sair do País. Até ao momento estima-se que $50 mil milhões (USD) já deixaram o país entre IPO's cancelados, financiamentos suspensos, valor das ações a cair e a continuar o ritmo o primeiro trimestre vai parar nos $70 mil milhões.
Recomendo a leitura do artigo da Bloomberg Businessweek As Investors Flee, Russia Inc. Is Feeling the Pain
Bravo!
A crise na Crimeia tem permitido tirar fotografias aos posicionamentos estratégicos de países e partidos. Mas chamo este assunto à baila para refletir sobre duas posições interessantes, a China e a Alemanha.
A China não quer sequer tocar no assunto e claramente não lhe interessa uma guerra. Aliás, à China não interessa sequer a existência de conflitos. A posição tem sido clara, a solução é diplomática e não deseja apoiar qualquer posição num conflito. Apoiar a Rússia seria contrariar a Ucrânia, a Europa e os Estados Unidos e entrar numa guerra económica com potenciais danos colaterais para o “Chinese dream” de dominar o mundo. Apoiar a Ucrânia seria afrontar o aliado histórico – a Rússia.
Ao mesmo tempo, é muito relevante a abstenção da China na votação tomada no Conselho de Segurança da ONU de condenação do referendo na Ucrânia. A China afirma-se desalinhada da Rússia e isso é um desenvolvimento substancial no equilíbrio das posições. A abstenção da China é um revés para a Rússia.
A Alemanha segue outra posição tendencialmente neutral. Claramente a Alemanha está com os restantes países ocidentais, mas a dependência energética face à Rússia é um argumento de peso. A Alemanha é o maior consumidor de gás da Rússia. Se é verdade que este facto prende a Alemanha ao tabuleiro, não é menos verdade que a Rússia também tem a perder se a Alemanha decidir entrar em conflito. Resta saber quem tem mais a perder se a Rússia caso não consiga vender o Gás à Alemanha, se a Alemanha se não conseguir fornecimentos de Gás da Rússia e não consiga outros fornecedores.
A Alemanha tem que ir a jogo mesmo que não queira. Publicamente as declarações vindas da Alemanha têm-se confinado à necessidade de manter a integridade territorial da Ucrânia, mas nos bastidores a Chanceler Angela Merkel tem estado muito ativa e influente, na tentativa de resolução pacífica deste conflito. Uma jogada inteligente e que se arrisca a ser o seguro da paz mundial. Vamos ver se suficiente.
Está mais do que visto que ninguém quer esta guerra. Só o Senhor Putin é que está a insistir em avançar em contradição clara com o Direito internacional e em violação da lei ucraniana. Existe um desejo pessoal de Putin de recuperar a influência russa perdida. Ao mesmo tempo, por mais discutível que seja a sua validade, com o resultado do referendo de ontem Putin ganha força. Usando um meio democrático, o referendo, prossegue as suas pretensões totalitárias, uma espécie de “com a verdade me enganas”. E o designado Ocidente está-se a deixar levar.
Nota Final: recomendo vivamente a entrevista a Andrei Illarionov, ex-principal conselheiro económico de Vladimir Putin, publicada no Expresso de 8 de março de 2014 e que ajuda a compreender um pouco a mente de Putin.
Nota Final 2: Sem me querer deter muito cá pelo burgo, e do muito que se tem dito por aí, não posso deixar de notar a crónica de Daniel Oliveira, revela em todo o seu esplendor a sua visão pró-russa, ao caracterizar que os partidos pró-Europa na Ucrânia são de Extrema-Direita. Que é o mesmo que dizer que a Europa e os Estados-Unidos, os partidos socialistas, sociais-democratas, democratas-cristãos e a Igreja – ou melhor as igrejas – estão a apoiar partidos não-democráticos. Se alguém está a prosseguir uma visão totalitária e nada democrática é Vladimir e a Rússia. Putin tem uma visão claramente decalcada de Hitler ou de Estaline que é totalitária. A discussão não pode ser desviada para a dicotomia Esquerda-Direita mas deverá centrar-se no respeito pelo Direito e pela Democracia.
Aquilo que se passa na Ucrânia vai já muito para além de uma luta entre os interesses pró- União Europeia ou os interesses pró-Rússia. Na verdade, Putin está a provocar um conflito prosseguindo os interesses de afirmação internacional da Rússia no concerto das nações, e pelo caminho procurar ganhar um território rico, a Crimeia, ou no limite a própria Ucrânia.
A União Europeia encontrou nas forças da oposição ucraniana um entusiasmo com o projeto europeu que parecia perdido. Na verdade, é difícil encontrar nos Países da União Europeia quem se bata com um entusiasmo proporcional em defesa do projeto europeu. Aquilo que se passa na Ucrânia deveria puxar pelo projeto europeu e renovar-lhe a esperança.
A par destes acontecimentos, a União Europeia prepara-se para eleições e ontem António José Seguro esteve na London School of Economics a proferir uma conferência na qual abordou diversos temas relacionados exatamente com este projeto europeu.
Os políticos portugueses tendem a falar e a comportar-se melhor lá fora do que cá dentro e António José Seguro não foi exceção. Falou eloquentemente sobre as suas ideias da Europa e sobre aquelas que devem ser a prioridades. E não é que esteve muito bem!?
António José Seguro apresentou propostas mais ou menos concretas (o que nem sempre é seu apanágio) que em resumo são as seguintes:
a) a eurozona deve ser uma verdadeira união política e monetária, com coordenação fiscal;
b) a constituição de um fundo europeu para a mutualização das dívidas soberanas acima do patamar dos 60%;
c) A separação do rating das empresas do relativo aos Estados;
d) o Banco Central Europeu (BCE) deve atuar contra a especulação de mercados.
Sem entrar em detalhe nas medidas, as quais merecem um debate sério, a intervenção de António José Seguro vale pela ideia de procurar um aprofundamento da união política e monetária.
Muitas vozes criticam a demora na intervenção da União Europeia, a descoordenação dos países da União Europeia na intervenção na Ucrânia, ou as indefinições no combate à crise económica e financeira que se abateu nos últimos anos. Mas na hora de se afirmar uma solução, tais vozes vêm logo erigir obstáculos a uma maior integração comunitária.
Ora, não haja dúvidas a solução para resolver os problemas nos processos decisórios e de tomadas de posição é mais União Europeia, através de maior integração política, maior coordenação monetária nos países da zona Euro, coordenação financeira e fiscal. No fim de contas, trata-se de procurar maior cooperação, coordenação e articulação entre os diversos países que compõem a União Europeia e a união monetária.